domingo, 15 de janeiro de 2012

11.01.12




Um mundo onde amizades e interesses se sobrepõem, nunca poderá vingar. Deste modo, os grandes talentos estarão sempre escondidos. Tudo isto, porque o ser humano não consegue fazer distinções, nem separar e estabelecer critérios que possam ser meramente cumpridos. O erro faz parte e é constante na nossa raça. Porém, existem situações em pleno dia-a-dia de constante injustiça. Injustiça essa que traz por arrasto a hipocrisia. Sim… esse desempenho de papel medonho em que fingimos ser bondosos quando a vontade pede para não o sermos.
Á cerca de um mês ou dois, nas férias de verão, dirigi-me a um bar onde sabia que iria decorrer um concurso de karaoke. Sabia-o porque frequentava esse bar com regularidade, e porque um familiar meu iria também participar. Visto que me considero um indivíduo autenticamente melómano, não poderia deixar de desfrutar de uma bela noite ao som de algumas vozes, que por sinal já conhecia. Existiam concorrentes a todos os níveis. Desde os razoáveis, àqueles que eram realmente muito bons. Acontece que alguns desses mesmos participantes já eram conhecidos da casa, já frequentavam o local á alguns anos e por sua vez conheciam grande parte dos jurados. Alguns mantinham mesmo uma relação íntima entre si. O dia da final do concurso tinha chegado ao fim. Talvez seja um tanto irónico dizer-vos quem foi o vencedor deste concurso de belas vozes. Mas digo-vos na mesma… Obviamente que foi um desses participantes já conhecidos da casa, que de facto tinha uma excelente voz e fazia óptimas interpretações de músicas, mas que no entanto, não merecia o lugar no pódio. Posso não ser uma perita em música, mas sei avaliar o que é bom.
Não, não fiquem a pensar que desejava que o vencedor fosse o meu familiar. Não.. Este encontrava-se dentro dos razoáveis, ainda com uma voz que exige trabalho e que não tem calibre para vencer um concurso ao lado de vozes como aquelas que ouvi. Talvez sejam um pouco maldosas estas minhas palavras, mas visto que estamos a falar de justiça, há que ser realmente sincero. Sabem quem merecia ganhar este concurso de Karaoke? Um rapaz. Um rapaz chamado Márcio. Com uma voz extremamente bela, que suava a melodia. Que sentia o que cantava, e ainda interpretava o que dizia. Mas sabem outra coisa? O Márcio era anão. E a sua voz grandiosa não conseguiu superar – a ver de alguns – o seu metro e meio de altura.
Agora pergunto eu: Num mundo como este em que nos encontramos, - onde amizades e preconceitos falam sempre mais alto - onde iremos arranjar espaço para os verdadeiros talentos que passam por uma humilhação como a que este rapaz que dá por nome de Márcio, passou? Não estou aqui a ser hipócrita e a fingir que me importo. Porque eu realmente importo-me. Não se trata de pena, trata-se da questão que tenho vindo aqui a debater: Justiça. Trabalhamos todos – ou melhor, nem todos, sejamos realistas, para alcançar um objectivo, e no fim, somos traídos por um défice de crescimento que faz de nós logo á partida pessoas incapacitadas. Pessoas incapacitadas que não servem para esse mesmo fim, porque vem sempre uma régua ou uma balança que estraga tudo. Destrói os nossos sonhos e lentamente destróis-nos a nós também. Na verdade eu estou cansada de ser julgada pelo meu metro e meio. E agora deixo a questão em aberto: As pessoas passaram a medir-se aos palmos?
Nessa noite, arrependi-me apenas de uma coisa. De não ter dito ao Márcio, o quanto ele valia. O quanto ele tinha sido injustiçado.
Gostava muito sinceramente de apresentar soluções para estes problemas. Mas digo-vos já que a meu ver, estas soluções não existem. Não existem porque assim como já referi, de forma implícita, existem aqueles que estão no topo da pirâmide, e aqueles que se encontram lá no fundo. Será sempre assim.
Daniela Teixeira

sábado, 7 de janeiro de 2012

Lost.

E aqui estou eu, sentada no chão do meu quarto. Fechada dentro destas quatro paredes onde tento descobrir os segredos do mundo. Percorro agora uma estrada comprida sem conseguir avistar o seu fim. A única coisa que vejo bem ao longe, é o horizonte. Vejo o sol quente junto às nuvens num fim de tarde, bem longe de mim. Tão quente como este asfalto que piso com os pés descalços. Queimo-me, mas mesmo assim não páro. Antes pelo contrário. Ando mais depressa para que o sofrimento não seja tão doloroso. Como quando estamos na praia e sentimos a areia a escaldar. Começamos a correr para rapidamente chegarmos ao chão. Começei então a correr. Queria que este queimar fosse mais suave, mais suportável. Mas tenho outro objectivo. Quero percorrer esta estrada. Quero chegar ao fim com cicatrizes, com os pés queimados. Quero suar com os raios que o sol sentiu necessidade de me mandar. Quero ser só eu e a estrada. Eu e o asfalto. Eu e a dor. Quero falar com ela. Compreendê-la. Suavizá-la. Quero chegar ao fim e encontrar-te. Quero sentir o horizonte, não apenas avistá-lo. E continuo a correr ingenuamente com a esperança de chegar a ti. De puder ver de perto a mesma beleza que me transmites de longe. Puder tocar-te e sentir as tuas mãos macias, ou até mesmo enrugadas (quem sabe). Quero olhar-te de perto e perguntar-te se eras capaz de percorrer a mesma estrada, queimando os pés no asfalto e levando com os raios calorosos do sol. Por mim. Assim como eu a percorro por ti.
Não quero que a noite chegue. Quero que demore a chegar. Preciso de chegar a ti antes do anoitecer. Preciso de alcançar-te rapidamente para que não caia na amargura da noite que me faz pensar em ti.
Estou quase. Começo então a ver o fim da estrada. Olho para trás e vejo os quilómetros que percorri, sempre por ti. Para alcançar-te, para puder finalmente realizar o nosso encontro.
Pisei a meta. A estrada terminou. E não te avisto. Sumiste para mais longe ainda.
Estou exausta! As feridas que o asfalto me proporcionou, impedem-me de continuar. Caio no chão. No fundo, eu já sabia. Como se tivesse tido uma premonição que me dizia que tu não existias. Que a tua existência era fruto da minha imaginação. Que em tempos senti as tuas mãos quentes apertarem as minhas. E não, não eram enrugadas. Eram macias, quentes, e fortes, e ancoravam as minhas. Ásperas, frias e completamente indefesas. A tua existência encontra-se perdida entre o meu passado e a minha imaginação.
Percebi então que percorro esta estrada todos os dias. Percebi que todos os dias os meus pés se queimam no asfalto por te quererem encontrar. Mas não te encontro. Sabes porquê? Porque estou apenas sentada no chão do meu quarto, dentro das minhas quatro paredes, onde tento -em vão-, descobrir as respostas para a tua ausência. As respostas para as perguntas sem resposta que existem no mundo. E é por isso que volto sempre ao chão do meu quarto. Porque é este mesmo chão que me ampara, que não me deixa passar dele. É ele que me mostra que esta é a minha realidade, e que a única coisa que posso fazer em relação ao horizonte, é apenas avistá-lo. Nunca alcançá-lo.



Daniela Teixeira