segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

A Sombra do Vento, de Carlos Ruiz Zafón; O Décimo Terceiro Conto de Diane Setterfield;


Mais um livro que está a lutar pelo lugar do pódio no meu coração. A Sombra do Vento, de Carlos Ruiz Zafón, veio a revelar-se uma obra fantástica. Daquelas previsíveis e ao mesmo tempo completamente imprevisíveis, que nos fazem oscilar entre a surpresa e o óbvio. Dei por mim a reparar que o impacto do livro não foi imediato. Após me deitar na cama, já de madrugada, surpreendi-me com lágrimas a escorrerem-me pela face. Apercebi-me da quantidade de coisas que, ao estarem escritas neste livro, conseguiam cruzar-se com alguns acontecimentos da minha vida. O morrer e o renascer tão próximos, e tão reflexos do meu eu. Como diria uma das personagens deste livro: «A arte de ler está a morrer muito lentamente. É um ritual íntimo. Um livro é um espelho e só podemos encontrar nele o que já temos dentro. Ao ler, aplicamos a mente e a alma e estes são bens cada dia mais escassos». Começo a aperceber-me que não existem livros predilectos. Que não existe o melhor de todos. Quando a certa altura nos damos conta que o livro é o nosso reflexo no espelho, esse livro já se apoderou da nossa alma. E apodera-se mesmo. Atingi uma fase em que tenho muitas preferências, e muitos livros predilectos. Pois todos os que se apoderaram da minha alma, lutam pelo lugar no pódio. Uns mais intensos que outros, mas ainda assim lutam. Mas não conseguem, porque sem darem conta já todos pertencem ao meu coração. O livro que li antes d’A Sombra do Vento, foi também uma autêntica surpresa. Encontrava-me a vaguear por uma livraria quando o livro se cruzou comigo. Após este encontro inesperado, não tive outro remédio senão trazê-lo comigo. E ainda bem que o fiz. O Décimo Terceiro Conto, de Diane Setterfield revelou-se um autêntico mistério que tocou igualmente o meu coração.

Daniela Teixeira

a sombra do ventodecimo-terceiro-conto-web









«Numa ocasião ouvi um cliente habitual comentar na livraria do meu pai que poucas coisas marcam tanto um leitor como o primeiro livro que realmente abre caminho até ao seu coração. Aquelas primeiras imagens, o eco dessas palavras que julgamos ter deixado para trás, acompanham-nos toda a vida e esculpem um palácio na nossa memória ao qual, mais tarde ou mais cedo – não importa quantos livros leiamos, quantos mundos descubramos, tudo quanto aprendamos ou esqueçamos-, vamos regressar. »
A Sombra do Vento

quarta-feira, 1 de agosto de 2012



Como é que o medo se pôde apoderar de mim? De tal maneira que deixei de lado o que sempre mais gostei de fazer.. Talvez porque o que mais gostava de fazer me levava à minha maior tentação. A quem eu sabia que não conseguia resistir. Talvez por isso fui deixando de lado aquilo que eu mais gostava. Alimentando-me assim, de coisas que achava que podiam ser substituíveis. Resultaram a curto prazo. Mas o desejo e a vontade voltam sempre. E por vezes, com mais força ainda do que da última vez. Mas a nossa vontade de resistir também se vai fortalecendo e ser capaz de dizer Não. E não é que mesmo sem querer, consigo fugir ao tema que quero abordar? É inevitável. Uma coisa puxa a outra. Uma coisa condiciona a outra. Foi sempre assim comigo. Daí este meu medo de começar. E foi por isso que tive de me afastar daquilo que eu mais gostava de fazer. Porque me tornei monótona, secante, sem graça. E eu sou mulher o suficiente para ser capaz de admitir isso. E como mulher, tenho os meus sentimentos a mil. Que me levam sempre ao mesmo destino. Destino esse que devia ter deixado de existir no mapa da minha vida. Mas agora que penso… Talvez nunca deixe de existir. Talvez vá estar sempre ali, até que eu aprenda a resisti-lo de vez, de modo a não permitir que sentimento algum me leve lá. Ter força necessária para fazer o que mais gosto e ser capaz de resistir á minha tentação (coisa que, por exemplo, não estou a ser capaz de fazer agora). Talvez porque após tanta conquista, tenha perdido um pouco de força. E é assim… Só talvez. Mas as duvidas sempre condicionaram a escrita. Ou não?


Daniela Teixeira

domingo, 8 de julho de 2012

VFX


Todos nós sabemos onde nos sentimos bem, onde nos sentimos em casa. Foi precisamente o que aconteceu. Mas eu não me senti em casa, senti que regressei a casa. Explorei de novo todos os cantos com uma nostalgia enorme. Nostalgia essa por saber que outrora já teria percorrido todas as pedras daquela calçada. Sim, a minha casa tem uma calçada. Tem touros. Tem paixão. Tem tradição. Tem uma pitada de medo misturada com ansiedade. Tem sardinhas, pão e muito vinho. E tem música. Deusa essa que passou e arrasou alguns corações. Inclusive o meu. O meu coração pertencerá sempre a muitos lugares. Mas pertencerá sempre mais a uns do que a outros. Regressei a casa e tornei-me inquilina por uma noite. Vi o teu sorriso que julguei ter ficado perdido numa noite de verão longínqua. Recuperei-o e substitui-o na minha memória. Um sorriso com paixão, com amor. Estranho não foi só voltar a casa, foi voltar a casas que percorremos todos juntos e que se perderam por aí. Por essa cidade rústica que tanto me aquece, tanto me aconchega o lado esquerdo do peito.
Daniela Teixeira

segunda-feira, 2 de julho de 2012

2.07.2012


Não sei exactamente como etiquetar o que vou começar para aqui a escrever mas certamente que não será uma treta. Talvez tenha um quê disso, mas não o será por completo. Hoje vou deixar de lado a minha faceta de pessoa educada e madura de lado e vou substituir, doa a quem doer, o meu modo de escrever pelo meu modo de falar. Só para para fazer entender a certas pessoas que quem toma as decisões na minha vida sou eu e mais ninguém. Se não são os meus pais que me condenam por aquilo que eu decido ou não fazer na minha vida, também não serão vocês certamente que terão de fazê-lo. Ainda que um  deles tenha o quarto ano e outro o nono, e que não percebam propriamente como funciona o ensino regular e os cursos profissionais (embora saibam que aquele que escolhi não tem exactamente a melhor das saídas), nunca me colocaram entraves. O sonho do meu pai era ver-me como engenheira. Mas esse é o sonho do meu pai. Ou seja, o meu pesadelo. O sonho da minha mãe era ver-me ligada à medicina, como quase todas as mães e os pais desejam. Mas isso, é apenas o sonho da minha mãe. Tenho a plena consciência de que terá alguma saída. Embora também ache que hoje em dia não haja nada que tenha saída. De qualquer modo, nada disto me atormenta. Prefiro acabar a minha vida atrás de um balcão mas sabendo que lutei sempre pelos meus sonhos, do que ter de chegar ao pé de alguém e dizer que o sujeito A tem uma cirrose biliar; que sujeito B tem cancro da mama e pouco tempo de vida; ter de suportar o cheiro a éter durante horas. Esse não é o meu mundo. Eu não nasci para isso. Sempre soube disso. Fico grata por todas essas pessoas existirem. Respeito imenso esse mundo e quem tem estômago para ele. Eu simplesmente não tenho. Não me identifico em nada com esse mundo. Gostava que as pessoas tivessem a mente mais aberta, e alargassem melhor os horizontes. Esta ideia estúpida de quem não segue Ciências está a fugir a matemática é a ideia mais estapafúrdia de todo o sempre. Sim, há muitos alunos que o fazem, sem dúvida. Mas isso são pessoas sem rumo, sem objectivos. Eu  não segui Ciências. Segui Humanidades porque esse é o meu mundo. Porque eu preciso de estar em constante contacto com o Mundo, com as Pessoas, com a Literatura, com a Música, com a Escrita, com toda a Arte. E quando o fiz, podem ter a certeza de que entrei no meu mundo. E neste mundo eu posso simplesmente ser o que eu bem entender. Posso até mesmo ser a médica que dedica a vida aos seus utentes e que tem de suportar o cheiro a éter para o resto da vida. Posso ser a engenheira que nunca fui. E quem não entende isto, tem sérios problemas. Quando decidi o que queria seguir fui alvo de críticas e sei que nada disso mudará. Será sempre assim. Porque as pessoas simplesmente não entendem. Nunca vão entender. Eu e os que partilham esta frustração comigo, seremos sempre aos olhos dos outros, as pessoas que mergulharam neste mundo porque não tinham outra hipótese. Mas não. Nós somos quem mergulhou neste mundo por paixão ao que fazemos e ao que nos rodeia. E nenhum de nós se arrepende disso. A paixão pode até não me levar aonde gostaria de chegar, pode até nem ser o que gostaria que fosse, mas pelo menos dá-me o que mais nada me pode dar. Sou quem quero, quando e onde quiser porque este mundo permite isso e muito mais. Na minha óptica as pessoas nascem destinadas para alguma coisa. Umas nascem com o dom do artesanato, com o dom da música… Outros nascem para dedicar as suas vidas a outras pessoas tal como os bombeiros e os médicos. Outros para a organização de eventos e para a pediatria. E certamente que todos eles terão as características indicadas para o fazer. Porque nasceram exactamente para isso. Assim como um tatuador geralmente é possuidor de uma capacidade incrédula de desenhar. Assim como um estilista tem uma capacidade incrível de desenhar roupas e depois simplesmente dar-lhes vida. Tudo isto é respeitável. Não podemos nascer todos para o mesmo. Em parte é isto que as pessoas têm de compreender. Todos nós sabemos as razões que a determinado momento nos levam a fazer ou a ser isto ou aquilo. Só nós sabemos as circunstâncias em que nos encontramos para tomarmos certo tipo de atitudes. Cada pessoa é um ser único. Livre de ser o que quiser e de se moldar de acordo com tudo o que o rodeia. Já alguém se perguntou porque é que os góticos se vestem todos de preto? Provavelmente não. Eu gosto, mas simplesmente não me identifico. Logo, não sou gótica mas também não critico quem o seja. Porque acredito que existem razões para a determinado momento uma pessoa se vestir dessa mesma maneira. Eu não tenho absolutamente estilo nenhum. Tanto abro o armário e retiro uma roupa ao acaso, como decido cuidadosamente o que vou vestir. Tanto me apetece ir a uma loja das mais comerciais que existe e vestir o mesmo que toda a gente está a vestir no momento, como me apetece vestir algo mais vintage e dirigir-me a uma loja em segunda mão. Com certeza que irei comprar aquilo com que me identifico. Querem condenar-me por isso? Acredito que haja imensa gente com vontade de o fazer. Acontece que eu não consigo estar muito tempo rodeada desse tipo de pessoas. Também não tenho estômago para isso. Gosto que as pessoas me aceitem do modo que sou. Sou muito eu em tudo o que faço. Tudo o que visto, digo, escrevo, compro,  penso, e tenho, revela um pouco de mim. Há que perceber que muitas pessoas são assim. Isso é bom! Estarmos rodeados das coisas com as quais no identificamos. No entanto, também é importante alargar os horizontes e aceitar também aquilo e aqueles com os quais não nos identificamos tanto. Desde que as pessoas se respeitem e consigam frequentar o mesmo espaço apesar de todas as divergências.
Todas as pessoas têm também a sua forma de amar. Uns não amam, gostam apenas. Esses provavelmente não entenderão o porquê de pessoas como eu ( e não só), vivermos ligadas à mesma pessoa há anos. Mas não têm que entender. Têm apenas de aceitar. Porque nunca irão conseguir compreender. Até mesmo vivendo ou tendo vivido uma situação idêntica, é impossível compreender. Cada caso é um caso, cada qual com as suas razões e em certas e determinadas circunstâncias. Ninguém poderá entender o que nos leva a permanecer num sítio quando já o deveríamos ter abandonado. E se nem nós próprios o entendemos, então muito menos os outros poderão entender.
E como já falei de mais, façam-me o favor de serem felizes. E deixem-me sê-lo também, com tudo aquilo que eu preciso para sê-lo.  Ainda que não o entendam, ainda que não concordem.
Daniela  Teixeira

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Untitled.



O tempo desgasta-nos de tal modo que a certa altura, apenas nos mantemos de pé. Sem sabermos sequer o que nos mantém de pé. Sem saber o que resta, o que ficou (se é que ficou). Deparei-me com os meus sonhos desfeitos, confesso. Confesso que me mantive calada. Apenas eu e só eu. Ao longo da vida vamos construindo sonhos, ainda que em cima de nada. Apenas na nossa inesgotável imaginação. É estranho o caminho que ela nos leva a percorrer. Ergue-nos e leva-nos tão alto para que de repente a realidade se coloque no espelho em frente a nós e nos revele o impossível. Revela-nos que existe uma linha que separa o que queremos do que um dia teremos. Eu deparei-me durante muito tempo com esta linha. Uma linha tão mas tão grossa… uma linha semelhante a uma faca que me cortou a raiz. Cortou-me os sonhos. Levou-mos. Aprendi que por vezes não resta absolutamente nada de nada. Sempre acreditei que havia um modo das coisas que amamos sobreviverem eternamente na nossa vida. E de facto há. Porque mesmo sem querermos permanecem como uma tatuagem. Permanecem no nosso dia-a-dia. E sublinho, estão presentes todos os dias. Mas já não estão connosco fisicamente. E dói. Porque a saudade mata. E eu tenho saudades. Tenho muitas saudades. Mas ainda me encontro aqui. Viva. E fico feliz por continuar viva após a batalha diária que enfrento. Tomei uma das decisões mais difíceis da minha vida há alguns tempos. E hoje percebo que não havia outro modo. Desliguei. Desliguei por completo. Não podia ser de outra maneira. Continuo a perguntar-me, dia após dia, se é isto que realmente quero. E respondo a mim própria de que é apenas isto que eu preciso. Sim. Hoje eu consigo fazer a verdadeira distinção. A verdadeira distinção entre o que eu quero e o que eu preciso. Todas as pessoas têm um caminho a percorrer. Eu quero continuar o meu. Estive parada durante demasiado tempo. Não posso dizer que encerrei um capítulo na minha vida, porque sinceramente nem eu própria acredito nisso. Julgo não estar ainda preparada para esse passo. Mas sinto que pelo menos consegui desligar. E sem querer ser dramática, eu volto a afirmar que os meus sonhos morreram. Aqui.







«O mais importante é libertar-me dos fantasmas, pois acarreto as sombras de todas as coisas a que não tive coragem para colocar um fim.»


Daniela Teixeira

Ao som de To Build A Home - Cinematic Orchestra; e Streets Of Philadelphia - Bruce Springsteen

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Tu

Tu,


Talvez lamentes. Talvez lamentes as horas a fio que desperdiçámos com meros desencontros. Ou, quem sabe, os desejasses mais do que ninguém. Talvez preferisses afastar-te, quebrando o contacto e tentando – em vão – anular os próprios sentidos. A verdade é que o vento continua a soprar, o mar continua suando a melodia através do barulho das ondas. As árvores continuam a dançar mesmo quando passas. As nuvens continuam a dar as mãos como se uma aliança inquebrável as unisse. O asfalto permanece quente independentemente da intensidade do sol, e as luzes da cidade que outrora se encontravam apagadas, hoje iluminam a minha alma. Sim, eu finalmente entendi. Entendi que existe mais para além de ti. Entendi que existem as coisas simples da vida. Os pequenos prazeres. Aprendi que existo, que sinto (falta), que quero, que necessito e acima de tudo, que posso. Apenas não posso tudo o quero! E eu quero-te e não posso. Ou pelo menos não devo! Aprendi a desfrutar das linhas sem sentido que vêm nos livros. Aprendi as notas de todas as canções que em tempos partilhámos. E hoje, vivo delas. Sinto-as como se se tratassem do teu corpo a tentar encontrar o meu num fim de tarde, e as árvores, o vento, as nuvens e o mar, fizessem parte do cenário que em tempos pintámos. Julguei que irias ocupar o teu lugar. Julguei que o frio que permanece em meu redor, pudesse um dia voltar a ser substituído pelo calor do teu corpo. Mas os julgamentos não bastam. Os julgamentos não concretizam os meus desejos porque não passam disso mesmo. Desejos que não podem ser saciados. E caio em mim e entendo que não me pertences. Entendo que o que em tempos fomos, não voltaremos a ser. Agora desejo somente os pequenos prazeres da vida… a brisa que vem do mar, os raios de sol que me queimam a pele, e a luminosidade que me encandeia. Vou escrever um livro e dedicar-te um capítulo, dizendo-te que foi o mais importante da minha vida.



Daniela Teixeira
14/02/12



sábado, 25 de fevereiro de 2012

Mudei-me!

Hoje voltei para avisar que me mudei, que criei outro blog... Ou melhor, não me mudei por completo porque continuarei a publicar aqui tudo o que escrevo. Simplesmente, criei um espaço onde posso publicar um pouco de tudo sem que tenha de me dedicar exclusivamente à escrita. Sim, a escrita é um bem essencial na minha vida, é um facto. Mas também é um facto que a música é o meu suporte, que a fotografia me deslumbra, que o Rap me mostra a realidade do mundo, que existem talentos escondidos por todo o lado, que se descobrem em muitos dos covers que encontro no Youtube. Se o poderia fazer aqui? Claro que podia. Mas é bom mudar, conhecer outras caras, outros espaços, designs diferentes, etc. Sei que no espaço que criei poderei partilhar tudo o que faz parte do meu dia-a-dia, através de tudo o que já referi anteriormente, desde a música á fotografia, ao rap e também à escrita, obviamente. Por isso, aqui fica http://daniellateixeira.wordpress.com .
Quem quiser dar uma vista de olhos é bem-vindo. Basta carregar no título 'Mudei-me!' deste mesmo post.
Obrigado e beijinhos*
Daniela Teixeira

domingo, 15 de janeiro de 2012

11.01.12




Um mundo onde amizades e interesses se sobrepõem, nunca poderá vingar. Deste modo, os grandes talentos estarão sempre escondidos. Tudo isto, porque o ser humano não consegue fazer distinções, nem separar e estabelecer critérios que possam ser meramente cumpridos. O erro faz parte e é constante na nossa raça. Porém, existem situações em pleno dia-a-dia de constante injustiça. Injustiça essa que traz por arrasto a hipocrisia. Sim… esse desempenho de papel medonho em que fingimos ser bondosos quando a vontade pede para não o sermos.
Á cerca de um mês ou dois, nas férias de verão, dirigi-me a um bar onde sabia que iria decorrer um concurso de karaoke. Sabia-o porque frequentava esse bar com regularidade, e porque um familiar meu iria também participar. Visto que me considero um indivíduo autenticamente melómano, não poderia deixar de desfrutar de uma bela noite ao som de algumas vozes, que por sinal já conhecia. Existiam concorrentes a todos os níveis. Desde os razoáveis, àqueles que eram realmente muito bons. Acontece que alguns desses mesmos participantes já eram conhecidos da casa, já frequentavam o local á alguns anos e por sua vez conheciam grande parte dos jurados. Alguns mantinham mesmo uma relação íntima entre si. O dia da final do concurso tinha chegado ao fim. Talvez seja um tanto irónico dizer-vos quem foi o vencedor deste concurso de belas vozes. Mas digo-vos na mesma… Obviamente que foi um desses participantes já conhecidos da casa, que de facto tinha uma excelente voz e fazia óptimas interpretações de músicas, mas que no entanto, não merecia o lugar no pódio. Posso não ser uma perita em música, mas sei avaliar o que é bom.
Não, não fiquem a pensar que desejava que o vencedor fosse o meu familiar. Não.. Este encontrava-se dentro dos razoáveis, ainda com uma voz que exige trabalho e que não tem calibre para vencer um concurso ao lado de vozes como aquelas que ouvi. Talvez sejam um pouco maldosas estas minhas palavras, mas visto que estamos a falar de justiça, há que ser realmente sincero. Sabem quem merecia ganhar este concurso de Karaoke? Um rapaz. Um rapaz chamado Márcio. Com uma voz extremamente bela, que suava a melodia. Que sentia o que cantava, e ainda interpretava o que dizia. Mas sabem outra coisa? O Márcio era anão. E a sua voz grandiosa não conseguiu superar – a ver de alguns – o seu metro e meio de altura.
Agora pergunto eu: Num mundo como este em que nos encontramos, - onde amizades e preconceitos falam sempre mais alto - onde iremos arranjar espaço para os verdadeiros talentos que passam por uma humilhação como a que este rapaz que dá por nome de Márcio, passou? Não estou aqui a ser hipócrita e a fingir que me importo. Porque eu realmente importo-me. Não se trata de pena, trata-se da questão que tenho vindo aqui a debater: Justiça. Trabalhamos todos – ou melhor, nem todos, sejamos realistas, para alcançar um objectivo, e no fim, somos traídos por um défice de crescimento que faz de nós logo á partida pessoas incapacitadas. Pessoas incapacitadas que não servem para esse mesmo fim, porque vem sempre uma régua ou uma balança que estraga tudo. Destrói os nossos sonhos e lentamente destróis-nos a nós também. Na verdade eu estou cansada de ser julgada pelo meu metro e meio. E agora deixo a questão em aberto: As pessoas passaram a medir-se aos palmos?
Nessa noite, arrependi-me apenas de uma coisa. De não ter dito ao Márcio, o quanto ele valia. O quanto ele tinha sido injustiçado.
Gostava muito sinceramente de apresentar soluções para estes problemas. Mas digo-vos já que a meu ver, estas soluções não existem. Não existem porque assim como já referi, de forma implícita, existem aqueles que estão no topo da pirâmide, e aqueles que se encontram lá no fundo. Será sempre assim.
Daniela Teixeira

sábado, 7 de janeiro de 2012

Lost.

E aqui estou eu, sentada no chão do meu quarto. Fechada dentro destas quatro paredes onde tento descobrir os segredos do mundo. Percorro agora uma estrada comprida sem conseguir avistar o seu fim. A única coisa que vejo bem ao longe, é o horizonte. Vejo o sol quente junto às nuvens num fim de tarde, bem longe de mim. Tão quente como este asfalto que piso com os pés descalços. Queimo-me, mas mesmo assim não páro. Antes pelo contrário. Ando mais depressa para que o sofrimento não seja tão doloroso. Como quando estamos na praia e sentimos a areia a escaldar. Começamos a correr para rapidamente chegarmos ao chão. Começei então a correr. Queria que este queimar fosse mais suave, mais suportável. Mas tenho outro objectivo. Quero percorrer esta estrada. Quero chegar ao fim com cicatrizes, com os pés queimados. Quero suar com os raios que o sol sentiu necessidade de me mandar. Quero ser só eu e a estrada. Eu e o asfalto. Eu e a dor. Quero falar com ela. Compreendê-la. Suavizá-la. Quero chegar ao fim e encontrar-te. Quero sentir o horizonte, não apenas avistá-lo. E continuo a correr ingenuamente com a esperança de chegar a ti. De puder ver de perto a mesma beleza que me transmites de longe. Puder tocar-te e sentir as tuas mãos macias, ou até mesmo enrugadas (quem sabe). Quero olhar-te de perto e perguntar-te se eras capaz de percorrer a mesma estrada, queimando os pés no asfalto e levando com os raios calorosos do sol. Por mim. Assim como eu a percorro por ti.
Não quero que a noite chegue. Quero que demore a chegar. Preciso de chegar a ti antes do anoitecer. Preciso de alcançar-te rapidamente para que não caia na amargura da noite que me faz pensar em ti.
Estou quase. Começo então a ver o fim da estrada. Olho para trás e vejo os quilómetros que percorri, sempre por ti. Para alcançar-te, para puder finalmente realizar o nosso encontro.
Pisei a meta. A estrada terminou. E não te avisto. Sumiste para mais longe ainda.
Estou exausta! As feridas que o asfalto me proporcionou, impedem-me de continuar. Caio no chão. No fundo, eu já sabia. Como se tivesse tido uma premonição que me dizia que tu não existias. Que a tua existência era fruto da minha imaginação. Que em tempos senti as tuas mãos quentes apertarem as minhas. E não, não eram enrugadas. Eram macias, quentes, e fortes, e ancoravam as minhas. Ásperas, frias e completamente indefesas. A tua existência encontra-se perdida entre o meu passado e a minha imaginação.
Percebi então que percorro esta estrada todos os dias. Percebi que todos os dias os meus pés se queimam no asfalto por te quererem encontrar. Mas não te encontro. Sabes porquê? Porque estou apenas sentada no chão do meu quarto, dentro das minhas quatro paredes, onde tento -em vão-, descobrir as respostas para a tua ausência. As respostas para as perguntas sem resposta que existem no mundo. E é por isso que volto sempre ao chão do meu quarto. Porque é este mesmo chão que me ampara, que não me deixa passar dele. É ele que me mostra que esta é a minha realidade, e que a única coisa que posso fazer em relação ao horizonte, é apenas avistá-lo. Nunca alcançá-lo.



Daniela Teixeira